Investigação da UC mostra impacto da ‘reciclagem’ e do ‘controlo de qualidade’ de células estaminais

16 maio, 2019≈ 6 mins de leitura

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Um grupo de investigadores do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra demonstrou – em parceria com investigadores da Universidade de Aveiro, da Universidade do Minnesota (Estados Unidos da América) e da Universidade de Oviedo (Espanha) – que regular os processos de reciclagem e controlo de qualidade de células estaminais poderá ter um grande impacto na medicina regenerativa e na luta contra o cancro.

O trabalho, realizado por Sílvia Magalhães-Novais e liderado por Paulo Oliveira e por Ignacio Vega-Naredo (ex-investigador do CNC, atualmente na Universidade de Oviedo), foi publicado na revista científica Autophagy, uma das mais reconhecidas na área. O objetivo do estudo foi tentar compreender como é que os processos de autofagia (‘reciclagem de componentes celulares’) e apoptose (‘morte celular programada’), responsáveis pelo controlo de qualidade celular nos diferentes tecidos, conseguem aumentar a competência das células estaminais (que têm como função originar vários tipos de células no nosso organismo). Este estudo poderá ter uma grande importância na medicina regenerativa, uma vez que sugere estratégias para manter saudáveis durante mais tempo as células estaminais dos nossos tecidos.

“Todos os nossos tecidos têm um reservatório de células estaminais, que vai sendo perdido durante o envelhecimento. Estas células têm de possuir um sistema de certificação de qualidade e resistência perante condições desfavoráveis, para que mantenham viáveis e com a capacidade de substituir as células mais diferenciadas que vão sendo perdidas”, refere Paulo Oliveira, investigador do CNC. “À medida que vamos envelhecendo, os reservatórios de células estaminais vão-se esgotando, uma vez que estas vão perdendo a sua capacidade de gerar células mais diferenciadas corretamente, acumulando erros no processo. Se compreendermos como é que estas células estaminais mantêm a sua qualidade, nomeadamente a reciclagem do lixo acumulado, ou um metabolismo ‘saudável’, poderemos preservar a sua função de regeneração de tecidos. Queríamos tentar perceber como é que conseguiríamos minimizar a transmissão de danos para células-filha, e garantir a fotocópia perfeita”, descreve o investigador.

Neste estudo, iniciado em 2009, os investigadores utilizaram células embrionárias de carcinoma de ratinho como modelo de estudo. Estas células têm a capacidade de se diferenciar em vários tipos de células, desde cardíacas a neuronais. Os investigadores utilizaram duas populações destas células: células que se mantiveram estaminais e células cuja diferenciação foi induzida por um processo químico. Observaram que os processos de reciclagem se iam perdendo à medida que as células se iam diferenciando – algo semelhante ao envelhecimento –, levando a uma acumulação de ‘lixo’ prejudicial para as mesmas.

“Esta linha celular é uma espécie de ‘lado negro da força’ das células estaminais, por ser derivada de um carcinoma embrionário, mas permite observar o processo da diferenciação em detalhe. Quando observámos estes eventos nas duas populações, observámos uma acumulação de lixo nas células, e mais componentes defeituosos, como mitocôndrias, as nossas fábricas de energia, em células diferenciadas”, refere Paulo Oliveira. “Quando parámos esta reciclagem nas células não-diferenciadas, observámos que elas se diferenciavam sozinhas. Conseguimos perceber que os processos de controlo de qualidade nestas células são mais aprimorados, e que estes processos de controlo de qualidade (pela autofagia e apoptose) têm um papel necessário no metabolismo e funcionamento das mesmas. No futuro pretendemos avaliar como outros processos de qualidade das células são afetados com a diferenciação e como podemos aplicar o conhecimento na medicina regenerativa. Outro caminho passa por fazer esta avaliação em células tumorais, uma vez que estas possuem grandes semelhanças às células estaminais que utilizámos no estudo”, conclui.

Os estudos futuros passarão por avaliar se outros processos de deteção e correção de erros no ADN também são perdidos neste processo de diferenciação e como este conhecimento poderá ser aplicado para contribuir para o aumento dos reservatórios de células estaminais dos tecidos. Compreender como estes processos serão semelhantes em células tumorais, explicando a sua resistência a agentes quimioterapêuticos, é outro objetivo futuro dos investigadores.

Além de Sílvia Magalhães-Novais, Paulo Oliveira e Ignacio Vega-Naredo, a equipa de investigadores do CNC conta com Rute Loureiro, Kátia Mesquita e Inês Baldeiras.

Este estudo foi financiado pela Fundação da Ciência e Tecnologia (FCT), pelo Fundo Europeu para Desenvolvimento Regional (FEDER) COMPETE 2020, no âmbito do projeto Cancel Stem, pelo Instituto de Salud Carlos III e pelo Instituto de Investigación Sanitaria del Principado de Asturias (ambos de Espanha). A versão integral do artigo pode ser consultada em https://doi.org/10.1080/15548627.2019.1607694.

 

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O trabalho foi realizado por Sílvia Magalhães-Novais.

 

 

CNC UC
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