Investigadores da Universidade de Coimbra desenvolvem modelo inovador no estudo do autismo

04 abril, 2019≈ 4 mins de leitura

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Uma equipa de investigadores do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra (UC) desenvolveu, em colaboração com investigadores do Massachusetts Institute of Technology (dos EUA), um novo modelo animal para estudar o autismo. Esse trabalho foi recentemente publicado na revista científica Nature Communications.

Caracterizado por estereotipias (ações repetitivas), alterações na linguagem e nos comportamentos sociais, o espectro do autismo é um transtorno neurológico geralmente causado por mutações de diferentes genes, que resultam em formas distintas da doença. No entanto, existem algumas alterações comuns às várias formas de autismo, como modificações ao nível dos recetores metabotrópicos de glutamato, um conjunto de recetores específico dos neurónios: é no estudo destes recetores que trabalho da equipa do CNC-UC alcançou um relevante avanço.

“Com este estudo pretendemos ter um conhecimento mais profundo sobre determinados aspetos importantes da patologia do autismo. O nosso trabalho é o primeiro a olhar para o gene GPRASP2 em detalhe. Achamos que este é um alvo interessante pois poderá ser utilizado na regulação de múltiplas formas desta doença”, descreve João Peça, líder da equipa de investigação.

O estudo publicado na revista do grupo Nature demonstrou em ratinhos que a remoção do gene GPRASP2 – que faz a reciclagem dos recetores metabotrópicos durante a comunicação neuronal – afeta o funcionamento do cérebro e os comportamentos dos animais. Através de engenharia genética, foi comprovado que esta função de reciclagem é extremamente importante, pois na sua ausência há uma menor maturação dos neurónios durante o desenvolvimento cerebral – particularmente na região do hipocampo, a zona do cérebro que possibilita a aprendizagem e a formação de novas memórias.

“As novas questões em que estamos a trabalhar passam por compreender um pouco melhor que outras zonas do cérebro e que tipos celulares é que realmente são responsáveis pelas diversas disfunções que nós observamos nos animais com mutação no gene GPRASP2. Desse modo, iremos também perceber que circuitos conseguimos modular com alterações neste gene. Por exemplo, interrogamo-nos se as alterações nos comportamentos sociais dos animais não serão devido a alterações no hipotálamo, uma outra região onde há grande expressão deste gene”, aponta João Peça. “Motiva-nos compreender se uma futura terapia que regule os níveis de GPRASP2 poderá ser utilizada em formas de autismo onde há perturbação dos recetores metabotrópicos. Por isso, estudo é uma semente para projetos futuros”, conclui o Investigador do CNC.

Este estudo – que, para além de João Peça, conta com Mohamed Edfawy como autor principal e com Joana Guedes, Marta Pereira, Mariana Laranjo, Mário Carvalho, Pedro Ferreira, Gladys Caldeira, Lara Franco, Ana Luísa Cardoso e Ana Luísa Carvalho como co-autores – foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, pela Fundação Bial, pela Brain & Behavior Research Foundation (dos EUA) e contou com o apoio do projecto europeu “Marie Curie”. O artigo “Abnormal mGluR-mediated synaptic plasticity and autism-like behaviours in Gprasp2 mutant mice” pode ser lido aqui.

 

Rui Marques Simões
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