Estudo avalia o impacto dos dispositivos eletrónicos no sono das crianças portuguesas

A investigação, que utilizou dados de 8.430 crianças, com idades entre os 3 e 10 anos, de escolas públicas e privadas das cidades do Porto, Coimbra e Lisboa, revela que os dispositivos eletrónicos disponíveis em casa, especialmente no quarto, diminuíram s

08 junho, 2021≈ 5 mins de leitura

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Embora os dispositivos eletrónicos sejam mais prevalentes nas casas de famílias portuguesas com maior estatuto socioeconómico, a disponibilidade desses equipamentos no quarto da criança é mais comum em famílias mais desfavorecidas, com impactos negativos no sono das crianças. A conclusão é de um estudo publicado na revista científica Sleep Medicine. 

Este paradoxo pode refletir fatores sociais e ambientais ao invés de financeiros. Uma explicação avançada no artigo científico é a possibilidade de as famílias de baixo estatuto socioeconómico terem menos conhecimento sobre os problemas de saúde associados ao uso excessivo de dispositivos com ecrã, menos tempo para supervisionar seus filhos ou menos oportunidades de envolvê-los em atividades extracurriculares.

O estudo foi conduzido por uma equipa do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) e teve por objetivo identificar a disponibilidade de diferentes dispositivos eletrónicos (televisão, computador, tablet, etc.) em casa e no quarto das crianças portuguesas de acordo com a condição socioeconómica, de modo a analisar as associações entre essa disponibilidade e o tempo de ecrã e o sono das crianças nos dias de semana e fim de semana.

A investigação, que utilizou dados de 8.430 crianças, com idades entre os 3 e 10 anos, de escolas públicas e privadas das cidades do Porto, Coimbra e Lisboa, revela que os dispositivos eletrónicos disponíveis em casa, especialmente no quarto, diminuíram significativamente o tempo de sono das crianças.

Independentemente da idade, sexo, ou do tipo de equipamento, o tempo despendido em frente ao ecrã «é sempre mais elevado em crianças de famílias de menor posição socioeconómica», explica Daniela Rodrigues, primeira autora do artigo científico, explicitando que entre crianças dos 3 aos 5 anos de idade, «ter uma televisão e um tablet no quarto foi associado a maior tempo ecrã. Entre crianças de 6 a 10 anos de idade, ter dispositivos no quarto (televisão, laptop e tablet) foi associado a maior tempo de ecrã e a menos horas de sono principalmente nos dias de aula».

Segundo Daniela Rodrigues, as conclusões do estudo mostram que «ter um equipamento no quarto da criança não está relacionado com uma maior disponibilidade do equipamento em casa (nem com maior disponibilidade financeira)» e alertam para a necessidade de «desenvolver estratégias eficazes para minimizar o acesso ao dispositivo na hora de dormir. O tempo excessivo em frente ao ecrã e a menor duração do sono têm importantes implicações na saúde das crianças». Além disso, o uso generalizado de dispositivos móveis e a «popularização de dispositivos eletrónicos no quarto são provavelmente responsáveis pelo aumento substancial do tempo de ecrã na infância ao longo dos anos», refere a investigadora do CIAS.

«Com a pandemia de COVID-19 as crianças foram obrigadas a passar mais tempo em casa e ficaram mais dependentes de equipamentos eletrónicos (para uso educacional, social, etc.), pelo que é urgente aplicar estratégias de gestão do uso destes equipamentos na hora de deitar. Especial atenção deve ser dada a crianças socioeconomicamente mais desfavorecidas por estarem em maior risco, como encontrado neste trabalho», finaliza.

O estudo mostra ainda que, apesar de a televisão ainda exercer efeitos consideráveis sobre o tempo de sono das crianças, os dispositivos móveis podem começar a ter um impacto maior no sono do que os dispositivos tradicionais.

 

Daniela Rodrigues

Daniela Rodrigues é investigadora do CIAS e primeira autora do artigo científico.

 

 

O estudo foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), pelo COMPETE 2020, Portugal 2020 e pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). O artigo científico está disponível: aqui.

 

Cristina Pinto
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