Intervenção destinada a diminuir a carga de sintomas de doentes com necessidades paliativas apresenta resultados promissores

A intervenção, destinada à formação de médicos de família em cuidados paliativos e à aplicação de um novo modelo de consulta em cuidados primários dirigida a adultos com necessidades paliativas, resultou na redução significativa da carga de sintomas físicos e emocionais dos doentes.

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Catarina Ribeiro
07 fevereiro, 2024≈ 5 mins de leitura

Participaram neste estudo 9 médicos e 53 adultos com neoplasia, doença pulmonar obstrutiva crónica, insuficiência cardíaca congestiva ou doença renal crónica em estádio avançado.

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Uma equipa de investigação, liderada pela Universidade de Coimbra (UC), desenvolveu uma intervenção destinada à formação de médicos de família em cuidados paliativos e à aplicação de um novo modelo de consulta em cuidados primários dirigida a adultos com necessidades paliativas. A intervenção apresenta resultados promissores, nomeadamente a redução significativa da carga de sintomas físicos e emocionais dos doentes com necessidades de cuidados paliativos que participaram neste estudo-piloto.

“A nossa intervenção apresenta resultados promissores, tendo alcançado melhorias significativas na carga de sintomas, de magnitude superior às que são normalmente encontradas em intervenções em cuidados paliativos”, revela o docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e médico da especialidade de medicina geral e familiar, Carlos Seiça Cardoso. Entre os principais resultados, destacam-se a redução de sintomas físicos e sintomas emocionais, como dor ou ansiedade.

O estudo-piloto foi desenvolvido com recurso a uma metodologia de avaliação de resultados reportados pelos doentes antes e depois de receberem a intervenção. Esta intervenção contemplou a formação de médicos de família e os momentos de consulta com os seus doentes, tendo sido avaliados sintomas físicos (por exemplo, dor, astenia ou obstipação), emocionais (por exemplo, ansiedade ou humor deprimido) e questões práticas e de comunicação. Participaram neste estudo 9 médicos e 53 adultos com neoplasia, doença pulmonar obstrutiva crónica, insuficiência cardíaca congestiva ou doença renal crónica em estádio avançado.

Durante 12 semanas, com uma consulta a cada três semanas, os médicos de família que participaram neste estudo-piloto implementaram o novo modelo de consulta. Esta nova consulta pretende “conciliar o modelo de registo clínico e de organização usada por todos os médicos de família em Portugal (registo clínico orientado por problema, seguindo o acrónimo “SOAP”), considerando o tempo de uma consulta de “Saúde de Adultos/Medicina Geral e Familiar”, explica Carlos Seiça Cardoso, “adicionando conteúdos que vão ao encontro das boas práticas para prestação de cuidados paliativos definidas na literatura, como o registo e a avaliação de vulnerabilidades, a utilização de uma ferramenta para avaliar carga de sintomas, a abordagem inicial dos principais sintomas reportados por estes doentes, entre outras especificidades”, elucida o docente.

“Com este modelo foi possível testar na prática clínica quotidiana dos médicos de família a aplicabilidade desta modalidade de consulta”, avança Carlos Seiça Cardoso. “O estudo mostra que os cuidados de saúde primários (mais concretamente, o acompanhamento nos centros de saúde por médicos de família) podem ser um contexto privilegiado para prestar cuidados a doentes com necessidades paliativas”, destaca.

“A intervenção testada é exequível e promissora, vai ao encontro das recomendações da Organização Mundial de Saúde e faz ainda mais sentido no contexto da reorganização do nosso Serviço Nacional de Saúde em Unidades Locais de Saúde”, sublinha o docente. O também primeiro autor do estudo destaca a relevância de, futuramente, “avaliar a efetividade e custo-efetividade da intervenção testada, que pode, eventualmente, ser transferida para outros contextos de saúde primários semelhantes ao deste estudo-piloto”.

De recordar que os cuidados paliativos contemplam uma abordagem holística de pessoas que enfrentam doenças graves, privilegiando a sua qualidade de vida, assim como a das suas famílias. “Doentes com níveis de complexidade mais elevados precisam de cuidados especializados prestados por profissionais com diferenciação em cuidados paliativos. Há, concomitantemente, necessidade de uma abordagem mais generalista, prestada por todos os profissionais de saúde, para doentes com necessidades menos complexas permitindo, desta forma, que mais doentes tenham acesso a cuidados paliativos já que muitas vezes são reservados apenas para maiores níveis de complexidade”, defende Carlos Seiça Cardoso.

A investigação foi orientada pela investigadora da Faculdade de Medicina da UC, Bárbara Gomes, e pelo docente da Universidade da Beira Interior, Filipe Prazeres. Os resultados estão disponíveis no artigo científico Feasibility and effectiveness of a two-tiered intervention involving training and a new consultation model for patients with palliative care needs in primary care: a before-after study, publicado na revista Palliative Medicine, revista científica de maior impacto na área dos cuidados paliativos a nível mundial, estando disponível aqui.